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  • Foto do escritorHelena Magalhães

Influencers in the wild. Ou a estupidificação do ser humano

Eu acredito nas redes sociais enquanto ferramenta gigante de transformação do mundo. Esta profissão de criadores de conteúdos é, provavelmente, uma das grandes profissões do futuro. Porque isto de criar conteúdo não se refere às selfies das Kardashians, aos vídeos de maquilhagem das influencers ou às fotos em bikini das Instagram models. Criadores de conteúdos são todas as pessoas que, a partir de uma plataforma digital, geram conteúdo, seja ele informativo, cultural, comercial ou de entretenimento. Não falo de quem depende de marcas a patrocinar vídeos de cremes no youtube ou viagens. Falo de pessoas que, de forma bastante inteligente, estão a (e vão) usar as redes sociais para criar negócios. Para responder a alguma coisa que a sua audiência procura e ser auto-sustentável a partir daí.


[e ninguém tira às Kardashians o mérito do império que criaram com todos os seus mil e um produtos - sendo relevantes ou não. Eu continuo a achar é que elas são grande parte do problema desta geração instagram]


Aquilo em que eu não acredito (e sobre o qual já escrevi várias vezes nos últimos anos) é neste novo mundo da Instagram life que está literalmente a estupidificar o ser humano. Vivemos tão obcecados em criar fotografias falsas (que nem sequer correspondem à nossa vida real) que estamos a ficar mais burros. Esta afirmação podia ser só minha. Mas até nem é - eu gosto de pesquisar e dar fontes mais úteis que a minha simples, modesta e, muitas vezes, irrelevante opinião. A revista Time publicou há uns anos - anos, atenção, antes desta febre toda - um estudo que dizia que as redes sociais vão deixar-nos mais burros. "Porque nos fornecem respostas e ideias sem exigir nenhum pensamento real. Os nossos poderes analíticos começam a perder-se, tal como um músculo não utilizado."



O que a revista Time não sabia é que também nos ia tornar depressivos, solitários, obcecados com a nossa aparência, com o consumo desmedido e dependentes de likes para nos sentirmos validados. O documentário da Taylor Swift, já agora, aborda exactamente isso: o perigo da nossa felicidade depender da validação dos outros.


Esta semana tornou-se viral uma conta engraçada: Influencers in the Wild. A revista online Magg chamou-lhe de "bastidores das fotos perfeitas do Instagram". O que se esqueceu de dizer é que é um reflexo de uma sociedade fútil e solitária digna de um episódio de Black Mirror.


Influencers à solta


O que é que vemos nesta conta de instagram? As fotografias e vídeos que simples humanos como nós fazem quando veem alguém nalguma situação ridícula para tirar uma fotografia para as redes sociais. Claro que isto tem piada visto de fora. Mas tem muito mais que se lhe diga. Vemos pessoas sozinhas a fazer grandes produções com um tripé no meio da rua; vemos mães que pedem aos filhos de quatro anos para lhe tirarem fotos numa pose estúpida; vemos raparigas a tentar (sem sucesso) fazer uma pose de yoga num penhasco porque aquela vista vai dar likes - mesmo que nunca tenha feito yoga na vida; vemos raparigas a dançar no meio da rua; a tentar não ser atropeladas no meio de NY para fazer uma fotografia a andar na passadeira; a tirar o casaco para fazer uma foto sensual no meio da neve; deitadas no chão; a desfilar; a fingir beber uma bebida da moda; a almoçar sozinha mas a fazer vídeos; a fingir sair de uma loja de luxo...




Tudo isto tem piada porque é fácil rirmo-nos de um comportamento que poderia ser um filme de comédia. Mas é a realidade. E é o sonho de toda uma geração que vive desta pequena sensação de fama etérea traduzida em pequenos números num ecrã mas que é uma promessa de felicidade, fama, dinheiro e sucesso.


Achei particularmente interessante este artigo de opinião no The Guardian onde Verity Johnson escreve que ter sido insta-famosa foi uma das piores coisas que lhe aconteceu. Ela escreveu:


Fiquei convencida de que era tão fascinante. Se era o centro das atenções no meu telefone, então era o centro das atenções na vida real. Mas isto faz de ti o pior tipo de idiota: egocêntrico e incrivelmente chato porque a única coisa em que pensas é em ti mesma. E não ajudou estar no meio dos 20 anos e, portanto, naturalmente inclinada a pensar que o mundo girava à minha volta. Mas este é também um tipo de fama particularmente cruel porque é muito inseguro. A insta-fama está no mais fundo da hierarquia, reconhecida pelos realmente famosos como a glória mais instável e não merecida. A maioria das pessoas famosas no mundo real ganha fama porque são muito boas no seu trabalho. Mas, para as influenciadoras, as fotos do seu rabo são o seu trabalho. Por isso, estamos constantemente conscientes da fragilidade da nossa fama, o que nos torna ainda mais desesperadas para a segurar.
Ficamos presos na nossa própria trivialidade do dia-a-dia. Normalmente tiramos uma fotografia porque queremos capturar um bom momento, certo? Como influenciadora, tens de fabricar esses momentos, anulando toda a diversão de um simples café porque estás a criar todo um cenário. Mas a parte mais perigosa desta insta-fama aos 20 anos é que vai mexer com o desenvolvimento da tua personalidade. Isso não me deixou apenas egocêntrica mas trouxe ao de cima as minhas piores qualidades. As redes sociais alimentam as partes mais sombrias das personalidades. A vaidade vende no Instagram. Quanto mais sensual for a foto, mais likes vai ter, mais tempo tu vais passar ao espelho a recriar essa fotografia. Ser insta-famosa depende de quanto estás disposta a explorar as profundezas do teu narcisismo. A insta-fama alimentou a minha própria vaidade e insegurança até que se tornou quase impossível controlá-las e abrir espaço para o meu "eu" melhor. Então decidi sair, sou oficialmente uma ex-influenciadora. Parei de postar, perdi muitos seguidores e apaguei a maioria das minhas fotografias clássicas de influencer num ataque de nojo. Percebi que para permanecer insta-famosa tinha que nutrir as partes mais patéticas da minha personalidade.  Honestamente, nenhuma quantidade de roupa de borla vale a pena.

Uau. Ficou a faltar o facto das pessoas, nesta obsessão pela fotografia perfeita, perderem o total respeito pelo ambiente e pelos outros, colocando-se até a si próprias em risco. Tudo para a foto que permita aqueles tão ansiados e desejados likes. E isto é assustador. Como estará o ser humano daqui a 20 anos?


Fotografias do Pinterest.

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