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  • Foto do escritorHelena Magalhães

Para as jovens raparigas de hoje: o que é, para mim, ser mulher em 2018


Há um bom par de anos, fui chamada de popstar na faculdade porque costumava usar umas calças cor-de-rosa justas com camisolas cortadas por cima do umbigo, numa altura em que a roupa da Bershka parecia o circo e, ainda assim, era sensacional. Com 18 anos, estava longe de entender como a minha imagem tinha um impacto na mensagem que passava aos outros. Porque era miúda, queria divertir-me, ser feliz, namorar, ser aceite, ser apreciada, ser sexy e, ao mesmo tempo, ser única, ser eu própria, ser diferente, ser arrojada. Mesmo que, com isso, me chamassem alcunhas tolas. Nunca ninguém me deu grande crédito – era apenas mais uma miúda a passear as suas roupas na faculdade. Felizmente, rapidamente passei de popstar a geek quando começaram a ver os meus 16 e 17 nas pautas.

Mais tarde, e depois de me ter apaixonado perdidamente por um tipo e um amigo me ter dito que ele não me levava a sério porque eu era muito espalha-brasas (imaginem-me com 23 ou 24 anos de mini-calções de ganga, umbigo de fora e botas até ao joelho na discoteca), viria a pensar muito nesta fase da minha vida e perceber como ser mulher, para mim, era muito mais do que vestir-me para me mostrar.  Havia tanta coisa que eu queria alcançar, tantos sítios onde queria chegar e isso não iria acontecer se continuasse a viver (e a ser) como uma eterna adolescente.


Ser mulher é ter esta voz para a mudança

Quando me oponho à exposição gratuita que se faz nas redes sociais e digo que é ridículo tirar fotografias em lingerie para se ter mil likes, não é porque tenha algo contra isso. Hoje temos a liberdade de nos expormos como bem nos apetecer, tal como eu já tive no meu tempo. É porque, na verdade, sinto que temos de ser muito mais do que isso. E porque a exposição actual ganha uma dimensão que, no meu tempo, não existia. Eu era espalha-brasas apenas para o tipo que gostava, para os amigos dele, para quem me via na discoteca ao sábado à noite. Não era para uma rede social pública onde a minha imagem é escrutinada ao máximo por qualquer pessoa dentro ou fora do meu círculo.

Para mim, ser mulher nos dias de hoje é ter esta voz para a mudança. Estamos nos ombros de todas as outras mulheres que marcaram o mundo antes de nós. E o que tento fazer e partilhar todos os dias é que temos de usar esse privilégio que nos foi dado para mudar o mundo para as mulheres que virão depois de nós. E este privilégio não nos chegou através de fotografias em soutien. Foi-nos dado às custas de muitas lutas. E eu tento sempre estar grata por essas batalhas que me deram a oportunidade de, hoje em dia, ter a vida que tenho.

Nunca nenhuma geração de mulheres antes de nós teve acesso a tanta informação através do uso da tecnologia. E o meu coração parte-se um bocado porque não há uma semana que não receba uma mensagem de alguém que me diga que sou estúpida, sou falsa, sou mal resolvida, sou complexada, sou isto, sou aquilo porque uso a minha voz para falar orgulhosamente destes assuntos.

E sempre que recebo este tipo de mensagens, lembro-me que é exactamente por isto que o feminismo ainda é importante – para moldarmos o futuro do que é ser mulher e para falar a esta geração actual. O Dia Internacional da Mulher não existe só para comemorarmos o espaço que ganhámos no mundo mas também para que continuemos a conquistar, a gritar, a falar e a avançar. Porque não basta dizer que o feminismo já não é preciso só porque temos uma vida confortável. Continuam a existir desigualdades à nossa volta e longa vida à Internet que nos permitiu chegar a mulheres de todo o mundo e ter conhecimento do quanto o mundo ainda precisa de ser mais justo para as mulheres. O feminismo é hoje ainda mais necessário globalmente do que nunca quando uma adolescente de 17 anos tira fotografias em soutien e as publica numa rede social para se sentir aceite.

Este ano, a Mattel vai honrar este dia ao lançar várias novas Barbies de mulheres históricas que ajudaram a mudar o mundo como Amelia Earhart, Frida Kahlo e Katherine Johnson. E a citação que a Mattel usou é incrível: enquanto marca que inspira o potencial ilimitado das raparigas, a Barbie vai honrar esta coleção de role models porque sabemos que as raparigas não podem ser o que não podem ver.

E isto é poderoso para caraças. Nós somos aquilo que vemos.

Se nos rodearmos de mulheres poderosas, inspiradoras e inteligentes temos tudo a nosso favor para nos tornarmos igualmente poderosas, inspiradoras e inteligentes. 

E ser mulher é mostrar ao mundo que temos mais crédito do que aquele que nos continuam a dar.

E eu entendo que dadas as diferentes direcções para que as mulheres são puxadas e com tudo o que temos à nossa volta graças às redes sociais, é difícil ter uma identidade coesa. O que vemos e o que sentimos sobre nós pode ser muito diferente do que aspiramos a ser pessoal e profissionalmente.

Eu sou confrontada com isso diariamente: sou trabalhadora independente, preciso de dinheiro, tenho uma rede social e às vezes fico tentada em aceitar todas as parcerias que me propõem mas, ao mesmo tempo, quero ter cada vez mais credibilidade e sucesso profissional na literatura e isso nunca vai acontecer se me tornar uma influenciadora tonta. Ou seja, este êxito momentâneo de likes e parcerias no instagram e fotografias em soutiens pode dar uma sensação de sucesso profissional mas é preciso pensarem a longo prazo e na identidade que estão a criar para vocês.

Ser mulher para mim hoje é reconhecer que podemos falar de feminismo de uma forma como nunca antes nenhuma outra geração de mulheres conseguiur fazer. Ser mulher é poder usar a minha voz para capacitar outras mulheres a fazerem mais e a criarem mudanças no seu mundo.

Se todas conseguirmos mudar o mundo que nos rodeia, o mundo em si vai mudar.

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